Como Steve Jobs dominou seu lado sombrio para revolucionar o mundo
- Alugamac
- 21 de jul.
- 9 min de leitura

"Não me lembro de um empresário que tenha mudado (e progredido) tanto quanto Steve. Suas qualidades negativas não desapareceram, mas ele aprendeu a dominá-las." É assim que Brent Schlender, um dos biógrafos do fundador da Apple, explica a chave do seu sucesso. No décimo segundo aniversário de sua morte, em 5 de outubro de 2011, mergulhamos na metamorfose do gênio.
"Vá se foder", disse Steve Jobs a um dos principais executivos da Lucasfilms, empresa de George Lucas, durante uma negociação. Quando uma terceira pessoa rebateu suas palavras com: "Você não pode dizer isso", Steve declarou: "Claro que posso! E, a propósito, vá se foder também."
Apesar dos insultos, George Lucas acabou aceitando a oferta de Jobs para assumir o Lucasfilm Graphics Group, uma divisão de sua empresa que mais tarde se tornaria a Pixar. A conversa, reproduzida em " The Steve Jobs Book", de Brent Schlender e Rick Tetzeli (publicado na Espanha pela Malpaso), explica muito bem como Jobs estava se saindo em 1985.

Uma criança especial.
Paul e Clara, pais de Steve, nascido em 1955 em São Francisco, incutiram nele desde pequeno a ideia de que ele era especial. Eles o adotaram após prometerem à sua mãe biológica que ele iria para a faculdade, condição que ela exigia. Seu pai fomentou seu perfeccionismo. Ele era um artesão e lhe ensinou a importância dos detalhes.
Foi assim que Jobs, sem rodeios, adquiriu a Pixar, uma equipe extraordinária de cientistas da computação que transformou para sempre a arte de contar histórias animadas. Ele os conhecera na primavera anterior, quando ainda estava na Apple, mas já havia sido demitido. Propôs uma aquisição, mas eles o ignoraram. Agora, à frente de sua nova empresa, a Next , Jobs decidira comprar o grupo. O que ele não sabia era que a Pixar mudaria não apenas sua vida profissional, mas também a pessoal. Seus gerentes, Ed Catmull e John Lasseter, conseguiram encarnar seu personagem e o ensinaram a administrar uma grande empresa.

"Na Pixar, ele descobriu, ainda que com relutância e contra seus instintos naturais, que às vezes vale a pena dar às pessoas talentosas o espaço de que precisam." Essa foi a primeira lição. A segunda: como administrar uma empresa. "Sem as lições que ele aprendeu na Pixar, não teria havido o grande segundo ato da Apple", diz Schlender.

Nascer no Vale do Silício. A experiência de crescer no início da década de 1970, no que ainda não era chamado de Vale do Silício, foi única. As áreas ao redor de Palo Alto e San Jose estavam repletas de engenheiros, químicos, cientistas da computação e físicos, atraídos pelas novas empresas de telecomunicações e eletrônicos. Para jovens precoces como Jobs e Wozniac, era o playground perfeito.
O primeiro ato da Apple, desde sua criação em 1976 até sua eventual demissão em 1985, tornou Jobs uma figura mundialmente reconhecida. Ele havia criado, com Steve Wozniak, o primeiro computador pessoal. Mas seu temperamento era insuportável. "Ele oscilava entre a grosseria, o cinismo e a arrogância", segundo aqueles que o conheciam na época. Assim, quando as vendas do Mac despencaram em 1984, a gerência não perdeu tempo em se livrar dele. "Eu calculei mal", disse ele a um amigo, explicando em lágrimas como a equipe, uma após a outra, se voltou contra ele.

Pouco depois, ele criou uma nova empresa, a Next, mas ali as piores tendências de Jobs se exacerbaram. "Sim, ele tinha sido um visionário, mas estava longe de ser um grande chefe. Em muitos aspectos, ele nem era adulto ainda", escrevem Schlender e Tetzeli. Seus gastos excessivos, suas decisões arbitrárias e sua incapacidade de delegar não davam trégua aos seus funcionários. Seu primeiro produto, o Cube, um computador voltado para universidades, foi um fracasso.
Aprenda a delegar e criar Toy Story
Era esse o cenário quando Jobs chegou ao que mais tarde se tornaria a Pixar. Pela primeira vez, ele não seria o protagonista. A Pixar já tinha sua própria filosofia e seus próprios líderes: Ed Catmull, presidente e chefe daquela equipe de gênios da computação, e John Lasseter, o diretor criativo, que também não tinha problemas de autoestima. Os dois controlaram as explosões de Jobs, e ele, em parte impressionado com o talento deles e em parte apaziguado por seu fracasso na Next, deixou que fizessem isso.

Como uma equipe. Jobs com Ed Catmull (à esquerda) e John Lasseter, os executivos da Pixar que, além de revolucionar a animação, reinventaram o próprio Steve Jobs.
Um exemplo radical dessa mudança é que, quando Lasseter o procurou para aprovar o orçamento do curta-metragem Tin Toy, a resposta de Steve foi: "Faça com que fique ótimo". O curta ganhou um Oscar em 1989. No jantar de comemoração, Steve apareceu com outro elemento que desempenharia um papel importante em sua vida, uma jovem loira com quem ele havia começado a namorar alguns meses antes: Laurene.
O amor da sua vida
Steve conheceu Laurene em uma conferência que ele deu na Stanford Business School, onde ela estudava. "Eu estava na primeira fila e não conseguia tirar os olhos do rosto dela", contou Jobs. "Perdi o rumo e comecei a me sentir um pouco tonto." Ele a seguiu até o estacionamento e a convidou para jantar. Começaram a namorar naquela mesma noite. E, com exceção das raras viagens de negócios de Steve, eles ficaram juntos todos os dias pelo resto da vida dele.

Steve Jobs e Laurene Powell chegam à 82ª edição do Oscar, realizada no Kodak Theatre em 7 de março de 2010, em Hollywood, Califórnia.
Eles formaram um bom casal desde o início. Laurene não estava interessada em sua riqueza ou ostentação. Eles se casaram no Parque Nacional de Yosemite em março de 1991. Ela estava grávida de seu primeiro filho, Reed. Eles tiveram mais duas filhas. E Lisa, a filha que Steve teve de um relacionamento em 1978 e que ele se recusou a reconhecer, veio morar com eles. "Foi uma forma complexa de expiação, dada a irresponsabilidade que ele demonstrou ao negar sua paternidade."
Laurene o obrigou a retificar seu maior erro: ter negado a paternidade de Lisa, a filha que teve aos 23 anos. Ele a integrou à família, junto com seus outros três filhos.
O casal fez todo o possível para dar aos filhos uma vida "normal". Moravam em uma casa sem proteção, centrada em torno de uma horta onde cultivavam seus próprios vegetais. Steve também começou a desenvolver um círculo próximo de amigos pela primeira vez — incluindo Catmull e Lasseter —, um círculo que manteve até o fim da vida.
Com a família e amigos de confiança, Jobs começou a se consolidar como empreendedor. "Aqueles foram os anos", explica Schlender, "em que seu estilo de negociação ganhou sutileza sem perder o ímpeto. Ele começou a praticar a nobre arte da paciência sem perder a perspicácia."
Com esses novos talentos, ele não só garantiu um acordo com a Disney para financiar seu primeiro longa-metragem, Toy Story , como também ajudou a Pixar a abrir o capital em uma jogada financeira magistral. Eles levantaram US$ 132 milhões com o filme e atingiram uma capitalização de mercado de US$ 1,4 bilhão... de uma só vez.
Ressuscitar a Apple
Em 1994, enquanto Jobs lidava com seus problemas na Next, que não conseguia entregar um novo produto, e com seu sucesso na Pixar, a Apple afundava, engolida pela Microsoft. A situação era tão desesperadora que seus líderes começaram a considerar o retorno de Jobs. E Jobs também, encorajado por Laurene. Não foi uma decisão fácil. Na Apple, tudo estava dando errado. Seus produtos eram caros e obsoletos. Apesar disso, no outono de 1997, Jobs retornou ao comando. A primeira coisa que fez foi uma reformulação. O novo slogan logo ficou claro: "Pense Diferente", uma frase que Jobs já usava em discussões internas. A campanha "Eles Devem Estar Loucos" foi um sucesso internacional. Mas não foi o suficiente: novos produtos precisavam ser lançados em menos de um ano.
Em busca do espírito.
Jobs sempre se interessou pela vida espiritual. Viajou para a Índia aos 18 anos para se aprofundar no hinduísmo. Mas isso não melhorou seu caráter. Em 1984, lançou o Macintosh original (foto). Pouco depois, seria demitido da empresa que havia fundado.
Em março de 1998, Jobs contratou Tim Cook, que trouxe da Compaq, onde era conhecido como "o Átila do estoque". Ele se tornou diretor de operações da Apple. Cook falava suavemente, mas era um executivo severo. Foi ele quem implementou os cortes e a reorganização da empresa.
Após o diagnóstico de câncer, Jobs se concentrou em um desafio: um celular que fosse um bom computador e um tocador de música. E bem pequeno. Três anos depois, ele lançou o iPhone.

O próximo passo era apresentar um novo produto, algo com personalidade. Jobs visitou o laboratório de design para debater ideias. Jony Ive, o diretor de design, um britânico que estava na empresa desde 1992, estava fazendo experimentos lá. Ele não ficou entusiasmado com os protótipos, mas Ive sim. E havia uma coisa que o intrigava: uma textura plástica translúcida que eventualmente se tornaria a inesquecível caixa do iMac, exatamente o tipo de produto "bonito" de que ele precisava. Aliás, o "i" antes de "Mac" era porque o iMac foi projetado para se conectar à internet (embora quase ninguém tivesse um), mas o "i" fazia mais do que isso. "I" significa "I", no sentido de que era "meu" computador e até mesmo um sinal de quem "eu sou". Com quase dois milhões de unidades vendidas no primeiro ano, o iMac se tornou o primeiro sucesso da nova Apple.
iTunes e iPod, reinventando o futuro
A partir de 2000, a máquina de Jobs atingiu a velocidade de cruzeiro. Primeiro, com a criação do iTunes e do iPod, o brilhante dispositivo com uma roda que funcionava como um mouse, criado por Jony Ive e sua equipe, uma interface que transformou o iPod em algo mágico e único. Ao mesmo tempo, ele começou a desenvolver suas lojas, aplicando os princípios das lojas de moda de luxo à venda de eletrônicos e computadores. Algo nunca antes visto.

Mais do que colegas.
Jon Ive, ex-vice-presidente e diretor de design da Apple, também foi seu amigo mais próximo em seus últimos anos. Um dos poucos com quem Jobs conversou sobre sua doença.
E em resposta às acusações de incentivar a pirataria com seu programa iTunes e sua campanha publicitária "Ripar, Mixar, Gravar", Steve criou a loja iTunes. Uma operação comercial complexa, acordada com gravadoras, que estabelecia o pagamento pela música baixada pelo usuário. "A criação desta loja online única é um ponto de virada na evolução de Steve Jobs", diz Schlender. Ele estava muito à frente de seu tempo e queria ir ainda mais longe.
Diante de um grande problema, um grande desafio...
Mas a vida de Jobs estava prestes a tomar um rumo inesperado. Em 2003, ele foi diagnosticado com um tumor cancerígeno no pâncreas. Ele explorou todas as opções: tratamentos dietéticos e curas alternativas (era vegetariano), mas não encontrou nada mais promissor do que uma cirurgia. Em 31 de julho de 2004, o tumor foi removido. Ele viveu mais sete anos, curiosamente os mais produtivos de sua vida. Steve se concentrou no trabalho mais do que nunca. "Era sua grande paixão", lembra Laurene. "O que ele fez foi dobrar sua concentração."
Após a operação, ele disse a Ive que queria se concentrar no desenvolvimento de um celular. Tinha que ser um bom celular, um bom computador e um bom tocador de música. E bem pequeno. "Para ele, isso foi um desafio que valia a pena", lembra Ive. Ele queria fazer algo radicalmente diferente.

O sucessor. Atual CEO da Apple, Tim Cook, era uma grande aposta para Jobs (na foto, já muito doente). Apesar das personalidades tão diferentes, Jobs tinha certeza de que era a pessoa certa para sucedê-lo.
O câncer retornou em 2006, com metástase para o fígado. Quase ninguém soube até três anos depois, quando ele precisou de um transplante. Sua saúde precária não ofuscou as operações da Apple. Naquela época, ele já havia simplificado sua vida ao máximo. Em janeiro de 2007, lançou o que provavelmente será lembrado como o produto mais importante de sua carreira: o iPhone. Desde o início, foi reconhecido como uma obra de arte. Hoje, é o produto eletrônico de consumo mais bem-sucedido e lucrativo da história.
Criando até o fim
Tim Cook soube que Steve precisava de um transplante de fígado em janeiro de 2009. Jobs tinha poucas chances de encontrar um doador porque seu tipo sanguíneo era muito raro.

Certa tarde, Cook saiu da casa de Steve tão perturbado com a piora do estado do amigo que foi fazer um exame de sangue. Descobriu que poderia ser um doador vivo e lhe ofereceu o fígado. "Eu queria muito que ele aceitasse, mas ele me interrompeu: 'Não vou permitir. De jeito nenhum!', disse. E simplesmente me ignorou. Nos treze anos que passei com Steve, ele deve ter gritado comigo apenas quatro ou cinco vezes.
Essa foi uma delas."
Cook descobriu que seu sangue era compatível com o de Jobs, um tipo raro. Ele lhe ofereceu seu fígado. Jobs recusou terminantemente.
No final, Steve encontrou um doador e pôde se submeter ao transplante em 21 de março de 2009. Ele passou dois meses excruciantes em estado crítico. Mais tarde, confidenciou a um amigo que considerou largar o emprego e passar mais tempo em casa, mas não o fez. Ele tinha uma missão em mãos: o lançamento do iPad, que foi um sucesso retumbante quando foi revelado em 27 de janeiro de 2010.
Não se sabia se Steve conseguiria apresentar pessoalmente o iPad 2. Quando ele finalmente subiu ao palco em 2 de março de 2011, a grande notícia não era o iPad, mas sim a morte de Steve Jobs. As ações da empresa despencaram assim que ele subiu ao palco.
Em 11 de agosto, Steve ligou para Cook e disse que queria que ele fosse o novo CEO da empresa. Eles discutiram a possibilidade de combinar essa função com a de Jobs como presidente do conselho, mas não foi necessário. Steve Jobs faleceu em 5 de outubro de 2011.
Steve e Cook conversaram muitas vezes sobre o destino da Apple após sua morte. Nas palavras de Cook, a mensagem-chave deixada por Jobs não corresponde ao caráter egoísta que ele frequentemente retrata. "A única coisa que Steve não queria que nos perguntássemos é: 'O que Steve faria no meu lugar?'"
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